Dez coisas que afectam o nosso clima Understand article

As actividades humanas continuam a influenciar o nosso clima à escala global, mas uma série de outros mecanismos interligados também desempenham um papel.

Não há dúvida de que o clima da Terra mudou ao longo do tempo geológico – mesmo antes do surgimento do Homo sapiens. Ao longo da sua história de 4,6 bilhões de anos, a Terra tem sofrido vários extremos, desde períodos em que o planeta foi quase completamente coberto de gelo, até a um tempo em que o Oceano Ártico atingiu uma temperatura amena de 23°C.

Estas mudanças climáticas são o resultado de muitos mecanismos que interagem uns com os outros, variando em termos de magnitude nos seus efeitos. No entanto, ao longo do século passado, um factor tem desempenhado um papel significativo na influência do nosso clima: o consenso esmagador entre os cientistas climáticos é de que a temperatura da Terra está a aumentar em resultado das emissões de gases com efeito de estufa provenientes da actividade humana.

Para revelar a verdadeira extensão do nosso impacto, os cientistas estão a examinar a variedade de mecanismos que interagem entre eles, e que impulsionam as alterações climáticas naturais e induzidas pelo homem, tanto no passado como hoje. Aqui, exploramos dez desses mecanismos. Cada um varia na medida em que afecta o clima da Terra, de modo que a ordem em que eles são discutidos não reflecte o seu significado.

Antarctica’s Brunt Ice Shelf
Fendas que se espalham ao longo da plataforma de gelo da Antártida estão em curso para truncar a plataforma e deste modo libertar um iceberge to tamanho da Grande Londres.
ESA, CC BY-SA 3.0 IGO

1. Sem os gases com efeito de estufa, a Terra seria uma planeta congelado

No efeito de estufa, gases na atmosfera da Terra (como o dióxido de carbono, o metano e o óxido nitroso) retêm a radiação infravermelha da Terra que de outra forma seria irradiada para o espaço. Graças a este processo natural, a superfície da Terra tem uma temperatura média de 15°Cw1. Sem estes gases, o nosso planeta seria um gelo -18°C, e a vida como a conhecemos não seria possível.

Alterações no nível dos gases com efeito de estufa podem ter impactos significativos no clima global. Por exemplo, no passado geológico da Terra, as erupções vulcânicas ou os impactos de asteroides (ver mais adiante) aumentaram o nível de dióxido de carbono na atmosfera, resultando em picos dramáticos na temperatura. Na história mais recente da Terra, os humanos ampliaram este efeito natural.

2. Os humanos estão a intensificar o efeito de estufa

Desde a Revolução Industrial, as atividades humanas aumentaram a concentração de gases com efeito estufa na atmosfera. Os níveis de dióxido de carbono aumentaram em consequência da desflorestação e da queima de combustíveis fósseis. Os níveis de metano aumentaram como resultado da criação de gado e do cultivo de arroz.

Até hoje, o efeito de estufa antropogénico conduziu a um aumento da temperatura global de aproximadamente 1.0°C acima dos níveis pré-industriais. Se o aquecimento global continuar à sua velocidade actual, poderá aumentar para um aquecimento de 3-4°C até ao final deste século. Os cientistas estão agora a salientar que o aquecimento deve ser limitado a 1.5°C – um incremento adicional não mais de 0.5°C em relação ao nível actualw2. Para se conseguir isto, temos de reduzir drasticamente as nossas emissões de gases com efeito de estufa. No lado positivo, porém, o efeito de estufa antropogénico é um mecanismo que temos a capacidade de mudar.

Observed and projected global temperature change
Alteração da temperatura global observada e projectada. Limitar o aquecimento global a 1.5°C exige uma redução drástica das emissões de gases com efeito de estufa. Adaptado do Special Report on Global Warming of 1.5°C
IPCC
Global temperature change relative to pre-industrial levels (°C): Alteração global da temperatura em relação aos níveis pré-industriais (°C);
Human-induced warming to date: Aquecimento induzido por humanos até hoje;
Likely increase based on the present rate of warming: Aumento provável com base na actual taxa de aquecimento;
Modelled range of warming if CO2 emissions decline to net zero in 2055 and other greenhouse gases are reduced after 2030: Modelo da taxa de aquecimento se as emissões de CO2 diminuírem para um zero absoluto até ao ano de 2055 e outros gases com efeito de estufa diminuírem após o ano de 2033

3. A formação de placas de gelo está ligada à órbita da Terra

Vivemos actualmente na Era do Gelo Cenozóico, que começou há 34 milhões de anos. A última fase desta era glacial é o período Quaternário, durante o qual a Terra mudou entre períodos glaciares e interglaciares, onde as camadas de gelo continentais cresceram ou recuaram.

Acredita-se que estes períodos glaciares e interglaciares sejam impulsionados por variações na órbita da Terra, conhecidas por ciclos de Milankovitchw3. Estes ciclos estão centrados em três parâmetros relacionados com o movimento da Terra: a sua excentricidade, obliquidade e precessão. Respectivamente, estes termos descrevem a forma da órbita da Terra (se é mais circular ou elíptica); a inclinação axial da Terra em relação à sua órbita; e a oscilação na direcção do eixo de rotação da Terra.

Por exemplo, o eixo da Terra inclina-se actualmente num ângulo de 23.5° em relação à perpendicular ao seu plano orbital, mas esta obliquidade varia entre 22° e 25° durante um período de cerva de 41000 anos. Esta alteração afecta a quantidade de radiação solar que atinge diferentes regiões da Terra, influenciando assim a a formação de placas de gelo.

Excentricidade: a forma da órbita da Terra muda desde uma forma ligeiramente elíptica até uma totalmente circular ao longo de um ciclo de cerca de 100000 anos.
Nicola Graf
Obliquidade: o ângulo do eixo da Terra varia entre 22° e 25° (em relação à perpendicular ao seu plano orbital, 0°) durante um período de cerca de 41000 anos.
Nicola Graf
Precessão: a oscilação do eixo da Terra em redor de um círculo completo durante um período de cerca de 26000 anos.
Nicola Graf
Earth: Terra;
Sun: Sol

4. Baixa actividade solar coincidiu com os períodos glaciares

A força do sol varia durante o seu ciclo de 11 anos de actividade. Num máximo solar – quando a activiade do sol é maior –  um número elevado de manchas solares (manchas mais escuras) e fáculas (manchas mais brilhantes) aparecem na superfície do sol. O efeito global é um aumento na radiação solar, que pode contribuir para climas mais quentes. Num mínimo solar – o período de menor actividade solar – ocorre o opostow4.

Um exemplo que vale a pena ser notado é o mínimo de Maunder, que descreve o período de raridade em manchas solares entre 1645 e 1715. Este mínimo solar coincidiu com o meio da “pequena era do gelo” – não uma verdadeira idade do gelo, mas o período em que a Europa e a América do Norte sofreram de um frio intenso, em que as “feiras do Gelo” eram realizadas no rio Tâmega, em Londres, Reino Unido.

Sunspot observations per year since the early 1600s
Número de observações de manchas solares desde 1600, com destaque para os mínimos e máximos solares
Global Warming Art/Wikimedia Commons, CC BY-SA 3.0
Number of sunspots: Número de manchas solares;
Maunder Minimum: Mínimo de Maunder;
Dalton Minimum: Mínimo de Dalton;
Modern Maximum: Máximo actual;
Sporadic observations prior to c. 1750: Observações esporádicas antes de cerca de 1750;
Average monthly measurements since c. 1750: Medições mensais médias desde cerca de 1750

5. O aumento de oxigénio causou um evento de arrefecimento

Há cerca de 2,5 bilhões de anos atrás, não existia oxigénio na atmosfera da Terra. Embora o Sol fosse menos brilhante naquela altura, o nosso planeta era habitável, em parte porque a concentração atmosférica de metano era 1000 vezes maior do que é agora. Tudo isso mudou, no entanto, com o Grande Evento de Oxigenação, que foi desencadeado pela presença de algas azul-verdes w5. Estes organismos microscópicos evoluíram para realizar a fotossíntese, produzindo oxigénio como um produto de desperdício.

Julga-se que oxigénio indesejado tenha reagido com o metano na atmosfera para produzir dióxido de carbono e água. O dióxido de carbono é 62 vezes menos eficaz no aquecimento do planeta do que o metano, por isso a substituição do metano pelo dióxido de carbono levou a uma diminuição drástica da temperatura, mergulhando a terra na sua primeira era glacial – a glaciação Huroniana.

6. O aquecimento pode alterar as correntes marítimas

As correntes marítimas e os sistemas de vento são componentes importantes do sistema climático. Como resultado do aquecimento diferencial, em que o Equador é mais quente do que os pólos da Terra, as correntes de convecção nos oceanos e a atmosfera movem a energia térmica na direcção dos pólos. Esta é a força motriz por detrás da circulação atmosférica e da circulação termohalina nos oceanos.

A circulação termohalina (ou transportador oceânico, como é por vezes conhecido) é impulsionada por diferenças na temperatura e salinidade da águaw6. Através dela, as águas quentes superficiais dos trópicos são levadas até ao Atlântico Norte, que por sua vez aquece partes da Europa. Existe a preocupação de que o aquecimento global cause o degelo das camadas de gelo da Gronelândia, diluindo a salinidade do Oceano Atlântico Norte e reduzindo a densidade das suas águas. Se a água não for densa o suficiente para afundar, a circulação termohalina seria interrompida.

Thermohaline circulation of the world’s oceans
Circulação termohalina nos oceanos do Mundo, que é impulsionada pelas diferenças na salinidade e temperatura da água. Os traços azuis representam as correntes de água profundas, enquanto que aos traços vermelhos representam as correntes de superfície.
Nicola Graf
Atlantic Ocean: Oceano Atlântico;
Indian Ocean: Oceano Indico;
Pacific Ocean: Ocean Pacífico;
Warm shallow current: Corrente superficial quente;
Cold and salty deep current: Corrente profunda salgada e fria

7. Os impactos dos asteroides causaram catástrofes climáticas

Há cerca de 66 milhões de anos, o asteróide Chicxulub de 10 km de diâmetro colidiu com a Terra, resultando no desaparecimento dos dinossaurosw7. O impacto lançou poeira para a estratosfera, que acredita-se ter bloqueado 50% da luz solar que alcançava a Terra. Isto teria comprometido a fotossíntese e levado ao colapso das cadeias alimentares. Também teria resultado numa queda dramática das temperaturas globais, mergulhando a Terra num “Inverno de impacto” que iria persistir por uma década.

No entanto, quando a poeira finalmente assentou, pensa-se que a Terra tenha experimentado um aquecimento global extremamente rápido. Este foi um resultado das massas de dióxido de carbono libertadas através do impacto em si (acredita-se que o asteroide tenha quebrado rochas carbonatadas) e os incêndios subsequentes que se espalharam pela Terra.

Acredita-se que outras extinções em massa (como os eventos de extinção do Permiano-Triássico e do Triássico-Jurássico) também tivessem sido causadas por eventos de impacto, embora não tenham sido encontradas crateras.

8. As placas tectónicas podem aquecer ou arrefecer o planeta

A cordilheira dos Himalaias – formada como resultado da colisão entre as placas tectónicas indiana e euroasiática – é um excelente exemplo de como a tectónica de placas pode ter um impacto no clima. Nos últimos 50 milhões de anos, a subida lenta dos Himalaias expôs rochas novas ao intemperismo químico. Neste processo, o dióxido de carbono da atmosfera liga-se a certos minerais na rocha, reduzindo a quantidade de dióxido de carbono atmosférico e arrefecendo o planeta.

O movimento das placas tectónicas também pode ter uma influência importante nas correntes oceânicas. Por exemplo, a criação do Portal Tasmânico e da passagem Drake – quando os continentes da Australásia e da América do Sul se separaram da Antártica – levou à formação da corrente circumpolar Antártica há mais de 30 milhões de anos. A corrente trouxe água profunda e fria da Antártica para a superfície. Acredita-se que esta actividade tectónica – combinada com o enterro do dióxido de carbono atmosférico da formação dos Himalaias – tenha desencadeado a Idade do Gelo Cenozóico tardio. Os cientistas podem prever onde as placas se moverão nos próximos 250 milhões de anosw8.

9. As erupções vulcânicas possuem efeitos mistos

Um outro efeito da tectónica de placas são as erupções vulcânicas, que podem afectar o clima da Terra por períodos que variam de dias a décadas. As grandes quantidades de dióxido de carbono que os vulcões emitem podem aquecer o planeta a longo prazo, mas a poeira e o dióxido de enxofre que eles lançam na atmosfera podem bloquear a entrada de radiação solar, levando a um arrefecimento global a curto prazow9.

A erupção do Monte Pinatubo nas Filipinas em 1991 lançou 17 milhões de toneladas de dióxido de enxofre para a estratosfera. Isto causou uma névoa de gotas de ácido sulfúrico que bloqueou a luz solar e reduziu as temperaturas globais em cerca de 0,4°C por dois anos.

Hot volcanic ash erupting from Mount Pinatubo
Cinzas vulcânicas quentes que brotam do Monte Pinatubo a 12 de Junho de 1991, três dias antes da erupção principal
Dave Harlow/USGS/Wikimedia Commons, domínio público

10. A cobertura de nuves complica o aquecimento global

As nuvens têm consequências importantes para o clima da Terra. As nuvens baixas e espessas arrefecem a superfície da Terra, enquanto as nuvens altas e finas aquecem o clima. A chave para a formação das nuvens são os aerossóis – partículas minúsculas que estão suspensas na atmosfera. Eles agem como pequenas ‘sementes’ em que o vapor de água condensaw10. Os aerossóis são muito mais do que simplesmente o que se pode encontrar numa lata de laca. Eles podem ser naturais (como a poeira ou o sal marinho) ou antropogénicos (como poluentes ou fumaça). Um aumento nos aerossóis antropogénicos poderia, portanto, resultar em mais formação de nuvens, o que (dependendo da altura da nuvem) poderia potencialmente compensar toda a extensão do aquecimento global.

A experiência CLOUD no CERN está a melhorar a nossa compreensão dos aerossóis e das nuvens e está a investigar a possível influência dos raios cósmicos na formação das nuvensw11. Estes raios são formados por partículas subatómicas com origem nas supernovas fora do sistema Solar, e acredita-se que influenciem a cobertura das nuvens através da formação de novos aerossóis.

Agradecimento

O autor e os editores gostariam de agradecer ao Dr Anwar Khan fo grupo de química atmosférica da Universidade de Bristol, Reino Unido, pela sua ajuda neste artigo.


Web References

  • w1 – Num video de “MinuteEarth”, aprenda como os gases com efeito de estufa funcionam para manter o planeta quente.
  • w2 – O Office for Climate Education (BASE) elaborou um resumo para professores do Relatório Especial sobre o Aquecimento Global de 1.5 °C (SR15) do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC).
  • w3 – Veja uma video que explica de um modo detalhado os ciclos de Milankovitch e o modo como eles mudam o nosso clima.
  • w4 – Um relato animado do “SciShow Space” explica como o Sol afecta o nosso clima.
  • w5 – Assista a uma explicação entusiasmante sobre o Grande Evento de Oxigenação.
  • w6 – Aprenda ainda mais sobre a circulação termohalina num video no YouTube.
  • w7 – Num video de 3 minutos, a BBC Earth explica o modo como o impacto do Chicxulub dizimous od dinossauros.
  • w8 – Veja uma animação de como os continentes são previstos de se moverem através da superfície da Terra como resultado de tectónicas de placas.
  • w9 – Um video de 2 minutos descreve como os vulcões podem alterar o clima.
  • w10 – Veja um excerto TED-Ed explicando o efeito que os aerossóis podem ter no nosso clima.
  • w11 – A experiência CLOUD no CERN é descrita em detalhe na página web do CERN.

Resources

  • Fazer o download gratuitamente do seguinte manual introdutório de ciência do clima no site ‘Bookboon’:
    • Sloan T (2016) Introductory Climate Science: Global Warming Explained 1st edition. Aberystwyth, UK: Aberystwyth University. ISBN: 9788740314083

Author(s)

Mike Follows é professor de física na King Edward School em Birmingham, Reino Unido. Antes de obter um PhD em física de temperaturas extremamente baixas, ele esteve uma década a trabalhar para o British Met Office, não sendo então surpresa de se saber que ele é atraído por questões globais e como a física pode ajudar a explicá-las e resolvê-las.

Review

As alterações climáticas são questões importantes para muitos estudantes em todo o mundo, como demonstrado por recentes campanhas lideradas por estudantes para aumentar a conscientização sobre o problema e exigir acções para evitar o aquecimento global. Este artigo desvenda os mecanismos que influenciam as alterações climáticas e pode ser usado como ponto de partida para discutir o impacto da actividade humana nas alterações climáticas e as respectivas consequências para a Terra.

Os alunos também poderiam pensar em acções que poderiam tomar para ajudar a preservar o nosso planeta. Além disso, estudar os mecanismos que influenciam o clima oferece a possibilidade de usar a biologia, a ciência da terra e a física ao mesmo tempo, destacando a natureza interdisciplinar da ciência.

Possíveis questões para discussão:

  • O que são gases com efeito de estufa? Dê dois exemplos.
  • Sem os gases com efeitode  estufa, qual seria a temperatura média da superfície da Terra?
  • O que acontece na superfície do sol durante um máximo solar?
  • Que efeito teve o aumento dos níveis de oxigénio na atmosfera terrestre na temperatura da Terra?
  • O que impulsiona a circulação termohalina?
  • Como é que um impacto de um asteróide afectaria a temperatura da Terra?
  • Como podem as erupções vulcânicas afectar o clima da Terra?

Mireia Güell Serra, professor de química e matemática, INS Cassà de la Selva, Espanha

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